Sobre os felizes

Existem pessoas admiráveis andando em passos firmes sobre a face da Terra. Grandes homens, grandes mulheres, sujeitos exemplares que superam toda desesperança. Tenho a sorte de conhecer vários deles, de ter muitos como amigos e costumo observar suas ações com dedicada atenção. Tento compreender como conseguem levar a vida de maneira tão superior à maioria, busco onde está o mistério, tento ler seus gestos e aprendo muito com eles. 

De tanto observar, consegui descobrir alguns pontos em comum entre todos e o que mais me impressiona é que são felizes. A felicidade, essa meta por vezes impossível, é parte deles, está intrínseco. Vivem um dia após o outro desfrutando de uma alegria genuína, leve, discreta, plantada na alma como uma árvore de raízes que força nenhuma consegue arrancar. 

Dos felizes que conheço, nenhum leva uma vida perfeita. Não são famosos. Nenhum é milionário, alguns vivem com muito pouco, inclusive. Nenhum tem saúde impecável, ou uma família sem problemas. Todos enfrentam e enfrentaram dissabores de várias ordens. Mas continuam discretamente felizes. 

O primeiro hábito que eles têm em comum é a generosidade. Mais que isso: eles têm prazer em ajudar, dividir, doar. Ajudam com um sorriso imenso no rosto, com desejo verdadeiro e sentem-se bem o suficiente para nunca relembrar ou cobrar o que foi feito e jamais pedir algo em troca. 

Os felizes costumam oferecer ajuda antes que se peça. Ficam inquietos com a dor do outro, querem colaborar de alguma maneira. São sensíveis e identificam as necessidades alheias mesmo antes de receber qualquer pedido. Os felizes, sobretudo, doam o próprio tempo, suas horas de vida, às vezes dividem o que têm, mesmo quando é muito pouco. 

Eu também observo os infelizes e já fiz a contraprova: eles costumam ser egoístas. Negam qualquer pequeno favor. Reagem com irritação ao mínimo pedido. Quando fazem, não perdem a oportunidade de relembrar, quase cobram medalhas e passam o recibo. Não gostam de ter a rotina perturbada por solicitações dos outros. Se fazem uma bondade qualquer, calculam o benefício próprio e seguem assim, infelizes. Cada vez mais. 

O segundo hábito notável dos felizes é a capacidade de explodir de alegria com o êxito dos outros. Os felizes vibram tanto com o sorriso alheio que parece um contágio. Eles costumam dizer: estou tão contente como se fosse comigo. Talvez seja um segredo de felicidade, até porque os infelizes fazem o contrário. Tratam rapidamente de encontrar um defeito no júbilo do outro, ou de ignorar a boa nova que acabaram de ouvir. E seguem infelizes. 

O terceiro hábito dos felizes é saber aceitar. Principalmente aceitar o outro, com todas as suas imperfeições. Sabem ouvir sem julgar. Sabem opinar sem diminuir e sabem a hora de calar. Sobretudo, sabem rir do jeito de ser de seus amigos. Sorrir é uma forma sublime de dizer: amo você e todas as suas pequenas loucuras. 

Escrevo essa crônica, grata e emocionada, relembrando o rosto dos homens e mulheres sublimes que passaram e que estão na minha vida, entoando seus nomes com a devoção de quem reza. Ainda não sou um dos felizes, mas sigo tentando. Sigo buscando aprender com eles a acender a luz genuína e perene de alegria na alma. Sigamos os felizes, pois eles sabem o caminho... 

Autora: Socorro Acioli - Escritora

Um comentário:

  1. Descrever a felicidade não é fácil se a consideramos fora de nós, se a entendemos como "momentos felizes" ou um lugar a ser alcançado, um ideal distante, dependente de fatores externos ou pessoas que a podem tornar realidade ou não. No entanto felicidade é O QUE SOMOS, não pode ser infeliz quem é feliz, assim como não pode ser preto quem nasceu branco, porque felicidade é a pele que nos reveste, impossível viver longe dela. Mesmo nos momentos difíceis de dor ou luto, a felicidade não se desliga de nós, não se afasta porque é a nossa própria integridade e, ao mesmo tempo que nos reveste, nos estimula de dentro para fora a superar toda desarmonia e desequilíbrio, porque felicidade é o que se é ou não, por isso algumas pessoas são felizes e outras não. Qualquer alegria de fora é passageira e fugaz, impermanente e efêmera. Porém mesmo sob o véu das lágrimas inexoráveis comuns à espécie humana, a felicidade permanece inabalável e imutável, indiferente às mudanças transitórias que nos condicionam a rir ou a chorar, porque ainda imperfeitos, dependentes que somos de situações, pessoas e coisas influenciadoras de nosso comportamento e/ou apreciação. Por isso a felicidade é um jeito inabalável e permanente de olhar para a dor ou para a alegria, para o lucro ou para o prejuízo, neles enxergando as lições que nos farão mais iluminados, mais sábios e mais eternos.

    ResponderExcluir

Agradecemos a sua participação!