O Exercício do Bem

Viver é difícil, dizem muitos. 

Conviver é muito, muito mais difícil é o que quase todos dizemos. Por qual razão assim nos expressamos já que conviver, compartilhar, estar com o outro é algo natural e necessário à própria vida em sociedade? Os outros nos afetam, pois nos despertam carinho, afeição, sentimentos de integração e pertença, ternura, confiança, amor.

Conviver com os outros, porém, nos expõe a sentimentos de repulsa ou indiferença, raiva, mágoa, ciúme, inveja... expressões dos seres espirituais imaturos que somos, carregando a dupla carga de egoísmo e orgulho que ainda nos caracteriza a intimidade do ser.

Em verdade, porém, nascemos para amar e sermos amados, como nos diz Emmanuel, e essa inclinação natural nos faz buscar a aceitação e o afeto do outro, nos diversos grupos sociais onde transitamos.

A difícil arte de viver convivendo se tornou, ao longo da história, um tema quase sempre presente nas discussões de escritores, pensadores e estudiosos da conduta humana. Muitas contribuições sérias podemos encontrar em culturas, religiões e correntes filosóficas diversas, haja vista que a dificuldade relativa à convivência humana se estabelece nas relações familiares, de vizinhança, de associações, de trabalho, enfim, em todos os grupos sociais, inclusive naqueles que se integram sob o denominador comum dos ideais religiosos.

No campo do sagrado, foco do nosso interesse, a difícil convivência ganha maior dimensão problemática em virtude da “ordem moral” definidora das condutas, consoante o código ético das diversas religiões. No que se refere ao Cristianismo, por exemplo, temos claras as orientações de Jesus em todo Seu Evangelho e Seu exemplo, quanto aos valores que deverão permear a nossa conduta perante o outro, tendo como regra áurea: Fazer aos outros o que desejamos que os outros nos façam. Algumas outras orientações mais específicas também encontramos na palavra do Senhor quando nos afirma:

“Fazei o bem aos que vos odeiam; orai pelos que vos perseguem e caluniam; perdoai não sete vezes mas até setenta vezes sete vezes; reconcilia-te com teu adversário enquanto estás a caminho com ele”... dentre outras.

Nestes tumultuados dias onde em nossa comunidade as acusações, ofensas e contumélias [1] se apresentam entre nós, somos todos chamados, absolutamente todos, a meditar em torno das nossas atitudes e sentimentos nos relacionamentos que travamos no interior das Casas e do próprio Movimento como um todo. 

As recomendações do Evangelho à luz da Doutrina Espírita aí estão a nos esclarecer quanto ao melhor caminho a seguir nos difíceis e intrincados processos de convivência social, naturalmente reveladora de conflitos, porque humana. 

Evidente que devemos, por outro lado, desenvolver estratégias e criar espaços de discussão em torno de questões sobre as quais precisamos de esclarecimento ou possuímos pensamento divergente. Isso, porém, é responsabilidade de todos, a ser construída coletiva, fraternal e sabiamente. 

[1] Contumélias: Expressão usada por Sêneca para indicar os insultos leves, menos graves do que as injúrias

Sandra Borba Pereira

Fonte: Jornal Mundo Espírita - Dezembro/2007


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Agradecemos a sua participação!