Por que um Evangelho Segundo o Espiritismo?

A palavra EVANGELHO vem do grego “EUANGELION” (Eu: boa – Angelion – notícia). Para os gregos mais antigos esta palavra (euangelion) indicava a gorjeta que era dada a quem trazia uma boa notícia. Mais tarde passou a significar a própria boa notícia “uma boa nova”, segundo a etmologia do termo. 

Como sabemos, Jesus não deixou nenhum documento escrito. Seus ensinamentos foram originariamente transmitidos de forma puramente verbal. Anos depois de sua partida para o mundo espiritual, seus seguidores sentiram necessidade de registrar os fatos de sua vida e seus ensinamentos. A tais registros, foi posteriormente dado o nome EVANGELHO ou BOA NOVA ou BOAS NOVAS ou BOAS NOTÍCIAS. 

Era, pois, o EVANGELHO DE JESUS CRISTO, ou a boa nova trazida à Terra por Jesus Cristo, embora para alguns, mensageiro e mensagem estivessem fundidos na mesma expressão, de modo que a boa nova, anunciada pelo Anjo Gabriel a Zacharias (marido de Isabel, prima de Maria, já idosa que engravidou de João Batista depois do anúncio do anjo) e depois a Maria, seria o próprio Cristo e não apenas a mensagem trazida por ele.

E essa fusão entre mensagem e mensageiro se expressa, de fato, nos escritos, nominados EVANGELHOS, que apresentam narrativas da vida de Jesus, paralelamente aos seus ensinamentos. Muitos evangelhos foram escritos, mas a Igreja reconheceu como autênticos apenas quatro: Mateus, Marcos, Lucas e João. Esses quatro livros, adotados e referendados pela Igreja Cristã passaram a ser chamados Evangelhos Canônicos (conforme os cânones – preceitos – da Igreja). Já os demais, não reconhecidos como autênticos, passaram a ser chamados Evangelhos Apócrifos (ou não autênticos). São citados como apócrifos os evangelhos de Tomé, Felipe, Judas e Maria, mas existem muitos outros. 

Quando falamos, portanto, do Evangelho isto é, da boa nova (compreendendo Jesus e sua mensagem ou apenas esta) escrita por determinado autor, costumamos nos referir da seguinte forma: “Evangelho de Jesus Cristo narrado por...” ou, ainda, mais frequentemente: “Evangelho de Jesus Cristo segundo...”. 

Pois bem, temos então, um Evangelho de Jesus Cristo narrado pelo Espiritismo ou, “O EVANGELHO DE JESUS CRISTO SEGUNDO O ESPIRITISMO”. Mas qual seria o significado disso? Será que, passados quase dois mil anos do nascimento de Jesus, o espiritismo teria resolvido recontar a sua história e reformular os seus ensinamentos? 

Não! Em absoluto!

Kardec respeitou os textos dos evangelhos canônicos, as traduções tradicionais e a divisão em capítulos e versículos, preservando os números originais. Bem, se é assim, deu-se à obra este nome apenas para causar desconforto e polêmica no seio da sociedade católica da época?

NÃO. Para o Espiritismo, a boa nova está exata e exclusivamente nos ensinamentos de Jesus. De acordo com Kardec, detectam-se nos evangelhos, ao lado desses ensinamentos morais, muitas narrativas de fatos, extremamente controvertidos (acontecimentos da vida de Jesus, milagres e profecias). Essas questões controvertidas são tantas e de tal ordem que o historiador americano, Prof. Geoffrey Blainey, na obra intitulada “Uma breve história do Cristianismo” afirmou que: “até o século 20, mais horas de estudos foram dedicadas à vida de Jesus do que à física, à química e talvez a todas as ciências combinadas” (p. 51).

E, de fato, temos notícias de incontáveis discussões sobre a aparência física de Jesus, o local exato de seu nascimento, a virgindade de Maria, o significado e a concretização ou não das profecias, para não falar do mais polêmico, que são os milagres (tratados por Kardec em outra obra – A Gênese). 

Embaixo de tanta polêmica, de tantas horas gastas, de tanto emprego de energia em torno de cogitações estéreis, jamais solucionáveis, que tinham por consequência apenas suscitar a intolerância e a discórdia, lutava para sobreviver, abafada, a verdadeira boa nova – a doutrina moral cristã -, que não era objeto de discussões, precisamente pelo fato de não haver, em torno dela, qualquer foco de discórdia. 

Não é difícil perceber que o ensino cristão estava perdendo seu curso natural, desviando-se para análises prolongadas, desfocadas, desnecessárias e irrelevantes, tal qual já acontecera ao velho testamento, na interpretação metódica e pormenorizada que lhe davam os escribas e fariseus, como se Deus estivesse a se ocupar dos detalhes infantis da vida terrena. 

Para fazer com que esse rio de bênçãos retomasse seu curso, Kardec, cuidadosamente, extraiu dos quatro evangelhos canônicos as partes que representam o ensino moral de Jesus, aplicável a toda a humanidade, em todas as épocas e em torno do qual não pairam controvérsias ou divergências. A intenção foi, efetivamente, destacar do todo os preceitos de ordem moral, facilitando a sua leitura e compreensão. 

Às transcrições bíblicas Kardec acrescentou algumas mensagens de espíritos sobre o tema, as quais foram recebidas pela via mediúnica em diversos países e por intermédio de diferentes médiuns. A autenticidade dessas mensagens se verifica pela concordância de seus conteúdos.

O trabalho de organização, realizado por Kardec, conquanto nos seja um facilitador, não desobriga o verdadeiro espírita da leitura da obra em sua íntegra, de modo a desenvolver o raciocínio crítico e obter informações históricas. 

Reforço esta conclusão, registrando que o próprio Kardec, no texto de introdução ao Evangelho Segundo o Espiritismo diz ter preservado a numeração original dos capítulos e versículos a fim de que o leitor recorresse “à classificação vulgar, julgando-se oportuno”. E ele próprio faz uma profunda análise desses fatos controvertidos (milagres e predições de Jesus) no 5º livro da codificação que é A GÊNESE.

O Evangelho Segundo o Espiritismo, portanto, enfeixa, por questão didática, o ensino moral de Jesus, mas isso não significa, de maneira alguma, que ele tenha desprezado todo o conteúdo remanescente, que inclusive, repito, foi objeto de estudo específico em outra obra.

O que Kardec fez foi reunir os textos morais neste livro, como o garimpeiro separa a pepita de outro do meio das outras pedras, entregando-a, já polida e brilhante em nossas mãos, para que com ela possamos confeccionar a joia de nossa reforma moral.

De todo o exposto, pode-se concluir:

1. O Evangelho Segundo o Espiritismo não traz nada de novo em relação aos quatro evangelhos canônicos (Mt, Mc, Lc e Jo) antes, extrai e transcreve deles, toda a doutrina moral de Jesus;

2. As mensagens mediúnicas acrescidas aos textos originais não modificam, mas, confirmam o seu conteúdo, trazendo tão somente elementos capazes de simplificar a sua compreensão;

3. A concentração da doutrina moral cristã em um único volume não nos exime da leitura do conteúdo completo como fonte de conhecimento histórico e para uma análise crítica dos fatos, afinal, a segunda obrigação de todo espírita é a busca do conhecimento (“Espíritas, amai-vos, espíritas, instrui-vos!”).

Fonte:http://obomsamaritanoavare.com.br/conteudounico/por-que-um-evangelho-segundo-o-espiritismo-


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