Conhecido
como biógrafo de Chico Xavier, o também mineiro Geraldo Lemos é um dos poucos
que pode compartilhar com a proximidade de um amigo a vida e os ensinamentos do
mestre espírita.
Geraldinho, eu já te esperava
há algum tempo, meu filho.
Com estas palavras o já famoso Chico Xavier deu as boas-vindas a Geraldo Lemos, na época um garoto de 17 anos.
Era o primeiro encontro dos dois. Ligados pela cidade de Pedro Leopoldo, (MG), Geraldo ouviu desde cedo as histórias de bondade do espírita.
A mediunidade de Chico consolou sua família em várias perdas e inspirou Geraldo a compartilhar as primeiras cartas com o médium.
Correspondências assinadas por “um amigo”, cartas sem remetente. Mas, antes que Geraldo falasse, Chico já sabia que estava ali o autor dos textos que “o faziam tão bem”.
Desse primeiro contato surgiram a amizade e a ideia de editar as obras de Chico Xavier, um trabalho que ele continua até hoje.
Com estas palavras o já famoso Chico Xavier deu as boas-vindas a Geraldo Lemos, na época um garoto de 17 anos.
Era o primeiro encontro dos dois. Ligados pela cidade de Pedro Leopoldo, (MG), Geraldo ouviu desde cedo as histórias de bondade do espírita.
A mediunidade de Chico consolou sua família em várias perdas e inspirou Geraldo a compartilhar as primeiras cartas com o médium.
Correspondências assinadas por “um amigo”, cartas sem remetente. Mas, antes que Geraldo falasse, Chico já sabia que estava ali o autor dos textos que “o faziam tão bem”.
Desse primeiro contato surgiram a amizade e a ideia de editar as obras de Chico Xavier, um trabalho que ele continua até hoje.
Com
uma serenidade marcante, fortalecida pela convivência com o espírito João de Deus,
Geraldo Lemos compartilhou com O POVO histórias sobre Chico e seu carisma.
Falou ainda sobre as perspectivas para o futuro da humanidade e os males de uma
educação materialista.
O
POVO - O senhor nasceu em Minas Gerais, assim como
Chico Xavier. Que histórias lhe chegavam sobre ele?
Geraldo Lemos
- Ouvia muitos casos da mediunidade dele porque a minha família materna,
família Machado, conhecia Chico Xavier desde quando ele era criança. Quando aos
17 anos ele se tornou espírita, começou a psicografar muitas mensagens de
familiares nossos. Uma tia da minha tataravó, Margarida Soares, que morreu em
1915, passou a escrever através de Chico, aconselhando os meus avós e
tios-avós. Depois minha tia-avó Adélia perdeu um filho de 18 anos, William, que
a partir de 1941 passou a escrever através de Chico. Ao longo dos anos foram 33
mensagens. Ele sempre acompanhou muito essa minha tia-avó com o sofrimento da
perda do filho, sempre escrevia cartas animando-a, tentando levantá-la da
depressão. Esses casos nós colecionávamos. E casos sobre a mediunidade
extraordinária dele, os fenômenos que aconteciam em Pedro Leopoldo. Fenômenos
de efeitos físicos, odoríficos com cheiro de rosas ou cheiro de éter, também de
materialização.
OP
- Mas quando aconteceu seu contato pessoal com ele?
Geraldo
Lemos - Eu morava em Belo Horizonte e ele em Uberaba. É
muito distante. Uma tia-avó, contemporânea dele de Pedro Leopoldo, chamada
Nair, me chamou para um lançamento de dois livros do Chico em São Paulo no dia
14 de outubro de 1981. E fiquei ali trabalhando junto com a equipe do Centro
Espírita União, que ela frequentava, preparando os livros para o Chico
autografar. E aquela noite foi memorável, pois a reunião começou às 20h e só
terminou às 7h30min do dia seguinte. Nunca tinha visto tanta gente junta. Para
chegar ao Chico tinham que passar por mim. Eu preparava os livros. Depois de
quase 12 horas de trabalho, eu que tinha 19 anos estava exausto. Ele, um senhor
de 71 anos, estava cheio de vida.
OP
- E quando o senhor teve a oportunidade de falar com ele?
Geraldo Lemos - Depois do
trabalho, minha tia chamou: “agora, você trabalhou, então, vai conhecê-lo”.
Acontece que mesmo antes de conhecê-lo, tendo em vista que a família Machado me
contava aqueles casos maravilhosos e eu ficava encantado, eu escrevia umas
cartinhas para ele, mas só assinava “um amigo”. Queria apenas mandar o
agradecimento pelo bem que ele fazia para minha família. Ninguém sabia disso.
Quando essa minha tia-avó foi me apresentar a ele: “Chico, este aqui...”. E ele
disse o meu nome: “é o Geraldinho, eu já te esperava há algum tempo, meu
filho”. Eu fiquei surpreso e mais ainda quando ele falou: “mas eu nunca entendi
duas coisas. Você me escreve cartas tão lindas, que me fazem tão bem, e nunca
entendi porque nunca as assinou e porque nunca colocou remetente para eu poder
te responder”. Eu fiquei sem resposta, fiquei muito emocionado e comecei a
chorar. Ele pegou um buquê de rosas e me convidou para visitá-lo em Uberaba.
Quinze dias depois eu já estava lá.
OP
- Em Uberaba, o que percebia de concreto de mudança na vida das pessoas que
procuravam Chico em busca de conforto?
Geraldo Lemos - Era comum ver
as pessoas muito sofridas. Ou pela perda de entes queridos, ou por doenças e
problemas emocionais como separações e dificuldades familiares muito intensas.
Elas chegavam lá com muita angústia. Depois de ter estado com o Chico havia uma
mudança extraordinária. A pessoa saia alegre, com mais esperança. Ele colocava
para a gente como a vida vale a pena apesar das lutas e do sofrimento. Tudo
passa. A gente não pode se fixar nas coisas ruins que nos acontecem. A gente
supera tudo. Basta ter fé, esperança e coragem para enfrentar os problemas da
forma como eles se apresentam, sem colocá-los como o pior fardo do mundo.
OP
- Essa é a lembrança mais positiva que o senhor tem dele?
Geraldo Lemos - Chico Xavier
marcava a gente todos os dias. A autenticidade mediúnica dele me marcou
profundamente. Acompanhei durante muitos anos quando ele recebia as multidões.
Começava 20h e, às vezes, ia até quatro da manhã. Ele escrevendo sem parar e
fazia questão de ler aquelas cartas. Eram dez ou 12 cartas de pessoas que
haviam desencarnado recentemente dando notícia para os seus familiares queridos
na Terra. Os detalhes eram tão íntimos e verdadeiros que isso me encantava. E
os céticos saiam dali convencidos, pois ele não tinha condição de saber
daqueles detalhes. Outro traço característico da vida de Chico é o amor ao mais
necessitado. Ele fazia questão de ir às casas mais humildes, visitar os
doentes, levar um pouco de ânimo. Todo sábado, às 14h30min, tinha distribuição
de alimento e de dinheiro.
OP
- Uma ação assistencialista?
Geraldo Lemos - Não. Ele dava o
equivalente a R$ 1 de hoje. Era uma coisa simbólica. Engraçado que determinado
dia uma senhora de São Paulo falou: “mas, Chico, o que esse dinheiro vai adiantar
para esse povo todo?” Ele, com a maior calma do mundo, falou: “Se não
adiantasse eles não estariam na fila”. Fiquei raciocinando o porquê de eles
estarem na fila. Não é por R$ 1. Estavam na fila para chegar perto do Chico,
ter um carinho com o Chico, trocar uma palavra, ouvir uma recomendação. Era um
momento íntimo do Chico com o povo.
OP
- O senhor chegou a presenciar algum sofrimento dele? Nessa questão da
mediunidade ou na rotina que ele tinha?
Geraldo Lemos - Presenciei
muito, pois ele foi um homem muito doente. Dizia para nós que tinha dor de
angina no peito. Às vezes, ele ficava muito abatido com essa dor e nem
levantava da cama. Mas ele brincava e falava que tinha uma companheira que se
chamava Dona Angina Pectoris. E ela era muito exigente. Ele tinha que
respeitá-la. No dia que ela gritasse ele tinha que respeitar e ficar na cama.
OP
- Ele se negava a tratamento?
Geraldo Lemos - Ao contrário.
No período que eu tive maior intimidade com ele, nas décadas de 1980 e 1990,
ele tomava 18 comprimidos por dia. Por recomendação médica. Ele tinha problema
nos olhos, um dos olhos era cego... Tinha a angina, hérnia de disco, aftas na
boca. Com relação à angina ele nos contou que adquiriu essa “companhia” através
da dor das mães. As mães que o buscavam com a angústia de ter perdido os filhos
e que ele abraçava com todo o carinho. A dor delas passou para ele através da
angina. Isso é também um trabalho de renúncia. Ele renunciou ao próprio
bem-estar para aliviar o outro.
OP
- Pessoalmente, ele chegou a lhe confortar em alguma passagem da sua vida?
Geraldo Lemos - Durante oito
anos eu me afastei do movimento espírita e das reuniões porque assumi uma
tarefa profissional em Belo Horizonte. Ser diretor de um banco. Trabalhava
demais e chegava em casa meia-noite. Não tinha tempo para me dedicar ao
espiritismo. E em 2003, no meu aniversário, 16 de abril, Chico já havia partido
e eu estava com aquele sentimento de abandono. Sentindo órfão de
espiritualidade, pois o Chico era uma referência. Minha mãe fez um aniversário
muito bonito com a família, mas cheguei em casa com uma profunda angústia
existencial. Fiquei me questionando que a vida não podia se resumir à minha
atividade profissional. Eu estava só trabalhando, trabalhando, trabalhando. E
em uma função muito materialista. Estava muito insatisfeito. Adormeci chorando.
Nessa noite tive um desdobramento espiritual e me encontrei com Chico Xavier
por intermédio do meu tio avô Zeca Machado. Foi o reencontro mesmo. De mim
comigo mesmo e com a minha espiritualidade. Ele me puxou a orelha e me mostrou o
caminho da espiritualidade. Que eu deveria voltar à mediunidade, voltar à
edição dos livros que sempre gostei. “Mas como vou fazer isso? Eu estou
afastado há oito anos?”. E ele respondeu: “não se preocupe, isso é conosco”. E
eu não podia imaginar que a partir daí as coisas iriam acontecer de tal forma
que tudo favorecesse a esse meu retorno.
OP
- Chegou a deixar a profissão?
Geraldo Lemos - Sim, ele havia
previsto que iríamos vender a instituição e sair do mercado financeiro. A
instituição foi vendida no dia 13 de maio de 2004, um ano depois.
OP
- O senhor acha que nesse mundo de crises financeiras e mídias sociais Chico
teria mais ou menos espaço para passar as suas mensagens?
Geraldo Lemos - Chico era
extremamente atualizado. Ele gostava de tudo o que era atual, ele era muito do
futuro. Na década de 1980, ele me perguntou: “Geraldinho, sabe me dizer o que é
multimídia?”. Eu não tinha a menor ideia do que seria multimídia naquela época.
E perguntei a ele o motivo da pergunta. “Os espíritos estão aqui me dizendo que
vai chegar o dia em que a doutrina espírita será divulgada em multimídia”. Olha
que coisa fantástica! Sem dúvida nenhuma, se o Chico estivesse hoje aqui ele
seria inserido nessas novas mídias. Acho que ele adoraria ter um Facebook em
que responderia rapidamente as pessoas. Não teria que ir aos Correios.
OP
- As pessoas hoje estão mais sedentas por essas respostas e na busca da
espiritualidade?
Geraldo Lemos - Eu sinto que
sim. Mas vejo hoje que até o perder-se faz parte do processo. Eu também me perdi
nesses oito anos em que me concentrei só na vida material e isso não me trouxe
felicidade. Acabei chegando à angústia existencial, que me levou a achar o que
é essencial. As pessoas hoje buscam muito conhecer o que é essencial da vida. A
busca é necessária. As pessoas têm que colocar à prova para se encontrarem. E
nesse momento de crises, tudo isso faz parte de um projeto grande de transição
do mundo. Que nada mais é do que um momento de amadurecimento da humanidade.
OP
- Estamos então num processo de avanço...
Geraldo Lemos - Na minha
juventude ninguém falava em ecologia, preservação ambiental. Hoje os meninos
pequenos têm essa consciência. Nós já tivemos avanços significativos. A questão
do ecumenismo. Antigamente os muros entre as religiões eram muito maiores. Hoje
existe um movimento de liberalidade no sentido de união das crenças mais puras
e verdadeiras. O Chico foi um exemplo disso. Ele transitou muito bem em todas
as religiões. Ele não foi uma pessoa preconceituosa.
OP
- E dez anos depois da partida de Chico o senhor acredita que ele continua
sendo buscado com a mesma força de antes?
Geraldo Lemos - Eu acho que até
mais. Engraçado, no ano de 2010 foi comemorado o centenário dele e nenhum de
nós espiritas, com sinceridade, imaginava a repercussão que o centenário de
Chico Xavier teria. A grande comemoração não foi espírita, foi do público, na
grande mídia, no cinema, na novela, no teatro. Chico Xavier ficou mais próximo
do grande público. E, de lá para cá, a gente sentiu que esse movimento favoreceu
a divulgação dos postulados espíritas. As pessoas estão mais abertas a conhecer
a própria obra que o Chico Xavier deixou.
OP
- Na obra de Chico, há uma citação sobre um episódio de guerra nuclear até
2019. Ele deu mais detalhes ao senhor sobre isso?
Geraldo Lemos - Essa é uma
questão complexa. Não é que ele previu a guerra. Ele me disse em 1986 que o
mundo teria um período de exceção, que começou em 1969. Foi a data de 20 de
julho quando o homem pisou na Lua. Naquele momento a humanidade atingiu uma
maturidade científica que a fez ver outros planetas, outros objetivos. E
naquele momento as potências angélicas que dirigem os destinos do sistema solar
ficaram preocupadas, pois os homens terrestres, naquela ocasião, eram ainda
muito ligados ao armamentismo. Jesus, que é o governador espiritual da Terra,
resolveu pedir um prazo para a humanidade se adaptar à paz. E esse prazo seria
de 50 anos. Período de exceção. Por isso vence em julho de 2019. Se as nações
mais responsáveis e cultas do planeta tivessem a responsabilidade de atravessar
esse período sem começar uma guerra de destruição nuclear a Terra iria entrar
em um processo de evolução extraordinário. A partir de julho de 2019. Aí sim os
avanços científicos e espirituais seriam intensos. Agora, tudo vai depender do
homem.
OP
- E se não houver consenso?
Geraldo Lemos - Se as
coletividades entrassem em guerra, que é o perigo, segundo Chico me falou, nós
teremos grandes problemas para enfrentar. A humanidade como um todo, inclusive
o Brasil. A própria Terra vai se revoltar. Vai abrir as suas entranhas, vulcões
extintos vão explodir. Justamente para mexer com essa ordem estabelecida e
mostrar ao homem que ele não é o senhor do Universo, que tudo tem um limite.
OP
- Isso preocupa o senhor?
Geraldo Lemos - Fiquei
preocupado em 1986, pois quando ele me contou faltavam ainda 33 anos. Realmente
era muito tempo. O mundo era outro em 1986. Ainda existia a Guerra Fria, o
Ocidente contra o Oriente, a China ainda era muito fechada. De lá para cá vimos
muita mudança positiva. O mundo se abriu mais, passou por provas grandes. Hoje
sou mais otimista, o risco nuclear é reduzido, embora saibamos do terrorismo.
OP
- Em meio a tanta violência como o senhor acredita que a gente pode ter paz?
Geraldo
Lemos - A única força no mundo para combater a
ignorância, a violência, a desigualdade, é a educação com espiritualidade. Não
pode ser uma educação materialista. Tem que ser uma educação que leve em conta
o ser integral. Nós não somos só corpo, somos também espírito. Por que Chico
Xavier influenciou tanta gente? Porque ele inspirou fé, esperança, coragem para
enfrentar as dificuldades. Os pais pensam em não dar educação religiosa aos
filhos porque quando eles crescerem vão decidir o que querer para si. Acontece
que pode ser tarde demais. Normalmente é tarde demais. O Chico dizia isso.
Normalmente os pais abandonam os filhos espiritualmente aos sete ou oito anos
de idade e quando acordam para a necessidade de buscar os filhos para junto de
si já é tarde demais, pois eles já estão na droga ou já cometeram suicídio. Eu
gostaria de lembrar uma frase que o Chico repetia muito e ele tinha ouvido de
terceiros. Ele dizia que a gente precisava meditar muito sobre ela: “Só muito
tarde é que se vê que não se amou o bastante”.
Fonte:http://www.opovo.com.br/app/opovo/paginasazuis/2012/08/27/noticiasjornalpaginasazuis,2907747/aprendiz-de-chico.shtml
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