Sem, pois, me deixar influenciar seja pelas ideias de
uns, seja pelas de outros, sigo a rota que eu mesmo tracei: tenho um
objetivo, vejo-o, sei como e quando o atingirei e não me inquietam os
clamores dos que passam por mim.
Crede, Senhores, as pedras não faltam em meu caminho!
Passo por cima delas, mesmo das mais altas e pesadas. Se se conhecesse a
verdadeira causa de certas antipatias e de certos afastamentos, muitas
surpresas nos aguardariam!
É ainda preciso, entretanto, mencionar as pessoas que
são postas, relativamente a mim, em posições falsas, ridículas e
comprometedoras e que procuram se justificar, em última instância,
recorrendo a pequenas calúnias: os que esperavam seduzir-me pelos
elogios, crendo levar-me a servir aos seus desígnios e que reconheceram a
inutilidade de suas manobras para atrair minha atenção; aqueles que não
elogiei nem incensei e que isso esperavam de mim; aqueles, enfim, que
não me perdoam por ter adivinhado suas intenções e que são como a
serpente sobre a qual se pisa.
Se todas essas pessoas decidissem se colocar, por um
instante sequer, em uma posição extraterrena e ver as coisas um pouco
mais do alto, compreenderiam bem a puerilidade de quanto as preocupa e
não se espantariam com a pouca importância que a tudo isso dão os
verdadeiros espíritas.
É que o Espiritismo abre horizontes tão vastos, que a
vida corporal, curta e efêmera, se apaga com todas as suas vaidades e
suas pequenas intrigas, ante o infinito da vida espiritual.
Não devo, entretanto, omitir uma censura que me foi
endereçada: a de nada fazer para trazer de novo a mim as pessoas que se
afastam. Isso é verdadeiro e a reprovação fundamentada. Eu a mereço,
pois jamais dei um único passo nesse sentido e aqui estão os motivos de
minha indiferença.
Aqueles que de mim se aproximam, fazem-no porque isto
lhes convém; é menos por minha pessoa do que pela simpatia que lhes
desperta os princípios que professo.
Os que se afastam fazem-no porque não lhes convenho
ou porque nossa maneira de ver as coisas reciprocamente não concorda.
Por que, então, iria eu contrariá-los, impondo-me a eles? Parece-me mais
conveniente deixá-los em paz. Ademais, honestamente, carece-me tempo
para isso.
Sabe-se que minhas ocupações não me deixam um
instante para o repouso. Além disso, para um que parte, há mil que
chegam. Julgo um dever dedicar-me, acima de tudo, a estes e é isso que
faço. Orgulho?
Desprezo por outrem? Oh! Não! Honestamente, não! Eu
não desprezo ninguém; lamento os que agem mal, rogo a Deus e aos Bons
Espíritos que façam nascer neles melhores sentimentos. E isso é tudo.
Se retornam, são sempre recebidos com júbilo. Mas
correr ao seu encalço, isso não me é possível fazer, mesmo em razão do
tempo que de mim reclamam as pessoas de boa vontade, e, depois, porque
não empresto a certos indivíduos a importância que eles a si próprios
atribuem.
Para mim, um homem é um homem, isto apenas! Meço seu
valor por seus atos, por seus sentimentos, nunca por sua posição social.
Pertença ele às mais altas camadas da sociedade, se age mal, se é
egoísta e negligente de sua dignidade, é, a meus olhos, inferior ao
trabalhador que procede corretamente, e eu aperto mais cordialmente a
mão de um homem humilde, cujo coração estou a ouvir, do que a de um
potentado cujo peito emudeceu. A primeira me aquece, a segunda me
enregela.
Homens da mais alta posição honram-me com sua visita,
porém nunca, por causa deles, um proletário ficou na antecâmara. Muitas
vezes, em meu salão, o príncipe se assenta ao lado do operário. Se se
sentir humilhado, dir-lhe-ei simplesmente que não é digno de ser
espírita.
Mas, sinto-me feliz em dizer, eu os vi, muitas vezes,
apertarem-se as mãos, fraternalmente, e, então, um pensamento me
ocorria: “Espiritismo, eis um dos teus milagres; este é o prenúncio de
muitos outros prodígios!”
Dependeria de mim abrir as portas da alta sociedade,
porém nunca fui nelas bater. Isso exigiria um tempo que prefiro empregar
mais utilmente.
Coloco em primeira instância o consolo que é preciso oferecer aos que sofrem, erguer a coragem dos caídos, arrancar um homem de suas paixões, do desespero, do suicídio, detê-lo talvez no limiar do crime! Não vale mais isto do que os lambris doirados?
Coloco em primeira instância o consolo que é preciso oferecer aos que sofrem, erguer a coragem dos caídos, arrancar um homem de suas paixões, do desespero, do suicídio, detê-lo talvez no limiar do crime! Não vale mais isto do que os lambris doirados?
Guardo milhares de cartas que para mim mais valem do
que todas as honrarias da Terra e que olho como verdadeiros títulos de
nobreza. Assim, pois, não vos espanteis se deixo partir aqueles que me
dão as costas.
Allan Kardec
Fonte: O Clarim, 2. ed., pp. 58-62
Fonte: O Clarim, 2. ed., pp. 58-62
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